MACHISMO NÃO É ARTE; MACHISMO NÃO É PUNK
MACHISMO É O SISTEMA OPRESSOR EM SUA FACE MAIS CRUEL
No dia 20 de julho, o cantor Ortinho, durante
um show no Festival de Inverno de Garanhuns 2013, incitou seu público a
só respeitarem as mulheres grávidas e a “meter o dedo no parreco” das
outras, que segundo ele, queriam mesmo é “dar” e “foder”.
O fato repercutiu nas redes sociais e a
sociedade civil pediu uma resposta tanto do cantor quanto da Secretaria
da Cultura, que financiou o show. A resposta veio, para maior decepção.
Em sua nota de desculpas, o cantor afirma que “o show foi bastante aplaudido” e que “houve uma supervalorização do fato por eu ser uma figura pública”.
Mais grave do que isso foi a nota da Secretaria de Cultura de Pernambuco e Fundarpe,
pela qual o Governo de Estado lamenta a frase dita pelo músico e finda
enaltecendo a importância da banda para a cena de rock dos anos 90 e
afirmando que a cena em que os fãs saudosos dançavam numa “roda de pogo”
[dança punk] era “muito mais importante do que qualquer frase pronunciada por Ortinho na mesma apresentação”.
Ao cantor, ao Governo do Estado e a todos que
trataram a situação como uma “frase infeliz” que não tirou o brilho do
show tão aplaudido é necessário dizer que o cantor incidiu no delito de
incitação pública à prática de crime, previsto no art. 286 do Código
Penal.
Mais grave: incidiu na incitação pública à prática de crime de ódio,
que é aquele motivado pelo preconceito e que seleciona intencionalmente
a sua vítima em razão do grupo social ao qual pertence.
Ora, Pernambuco é um dos estados da federação
que bate recordes de violência contra a mulher que não podem orgulhar a
ninguém: O Brasil ocupa o 7º lugar entre os países com de elevados
níveis de feminicídio. Pernambuco está entre os 5 estados com maior taxa
de morte por agressão a mulheres.
E em Pernambuco tivemos 273 mortes de mulheres em 2011 e 207 em 2012. Dessas mortes, cerca de metade praticada por parceiro íntimo. Como é possível, nesse contexto, aceitar a incitação à violência contra a mulher como uma frase menos importante do que os aplausos que o cantor recebeu?
E em Pernambuco tivemos 273 mortes de mulheres em 2011 e 207 em 2012. Dessas mortes, cerca de metade praticada por parceiro íntimo. Como é possível, nesse contexto, aceitar a incitação à violência contra a mulher como uma frase menos importante do que os aplausos que o cantor recebeu?
Alegar uma roda de pogo como desculpa para
diminuir o impacto da incitação à violência contra a mulher é também uma
ofensa ao movimento punk, contra-cultural e subversivo por essência.
Tampouco alegar liberdade de expressão para erradicar a liberdade alheia pode ser chamado de arte.
Tampouco alegar liberdade de expressão para erradicar a liberdade alheia pode ser chamado de arte.
O machismo é uma das formas de opressão do ser humano mais tradicionais e enraizadas na cultura do establishment, é uma das mais crueis formas de imposição de força arbitrária e injusta.
E o machismo só existe porque é culturalmente
aceito. Porque ele é repetido à exaustão como algo inofensivo. Tão
inofensivo a ponto de ser menos importante do que uma roda de pogo.
Nós, mulheres, somos agredidas todos os dias
pelo simples fato de termos nascido mulheres. E enquanto houver uma
cultura de tolerância e de aceitação dessa violência, nós vamos
continuar morrendo e sendo silenciadas.
Por isso, nós é que estamos “pogando” no
sistema opressor, patriarcal, machista, excludente, desumano, ao
denunciarmos a brutalidade da violência contra a mulher e ao propormos
um discurso de fato contra-cultural.
E convidamos o cantor e a Secretaria de
Cultura de Pernambuco a, junto conosco, “pogar” de verdade, porque fazer
pose de punk é tão falso quanto inútil.
Diante disso, pedimos:
1) A
retratação do Governo do Estado sobre a nota emitida acerca do
episódio, através da sua Secretaria de Cultura e Fundarpe, reconhecendo
que a incitação à violência contra a mulher é fato gravíssimo que deve
ser repudiado por toda a sociedade e pelo próprio Governo e que tem
importância autônoma em relação ao pretenso valor artístico do evento.
2) Que
haja articulação entre a Secretaria da Mulher e a Secretaria de
Cultura, assegurado o diálogo com a sociedade civil e os movimentos e
articulações de defesa dos direitos das mulheres, para fortalecimento
das políticas públicas culturais feitas por e voltadas para a mulher.
3) Que
seja criada uma comissão especial com participação dos diversos
segmentos da sociedade civil para elaborar projeto de lei que vede o
financiamento público de produtos culturais que promovam discurso de
ódio e que promova a relação entre os direitos das mulheres e as
expressões culturais.
4) Que
seja firmado Termo de Ajustamento de Conduta entre a Secretaria de
Cultura e o cantor, no qual o mesmo se compromete a jamais promover
qualquer discurso de ódio contra qualquer grupo social oprimido, como
condição para que possa participar de eventos promovidos pelo poder
público estadual.
Recife e Garanhuns, 27 de julho de 2013.
Marcha das Vadias do RecifeDCE UNICAP
Coletivo Rompendo Amarras
Movimento Zoada
Grupo Curumim
Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás
Grupo Diversidade
UNICAP
Coletivo Flores Crew
Coletivo Ou Vai ou Racha
Najup – Núcleo de Assessoria Jurídica Popular/UFPE
Partido Pirata do Brasil
PSol
Muda – Direito UNICAP
http://marchadasvadiasrecife.tumblr.com/post/56645015524/nota-de-repudio-as-declaracoes-machistas-de-ortinho
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